Eu, caçador de mim

Por me saber exatamente como sou, tenho consciência de que a caminhada ainda é longa. E sigo. Porque o custo por desconhecer-se é infinitamente maior.


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Eu me conheço. Sei que choro em casamentos, formaturas, batizados, seja de amigos ou estranhos. Sei que não suporto violência contra indefesos. Vou me desmanchar vendo uma água com açúcar, lendo os cartões de Dia das Mães dos meus filhos, pensando nos meus que se foram. Mas não vou derramar uma lágrima sob stress ou no trabalho. Meu estoque é gasto com emoção e tão só. Eu me conheço. Sei que não fui talhada para nadar mar adentro, dormir pouco, ficar quieta, praticar esportes radicais.

Sei dos meus medos e dos meus limites físicos e, principalmente, os psicológicos. E, por conhecê-los, respeito-os. Sei que vou me reapaixonar no outono, desejar um inverno muito frio, me inspirar na primavera e reclamar no verão. Eu sou reclamona, durona, determinada. Mal-humorada pela manhã. Às vezes também à tarde e à noite!

Eu me conheço. E por isso sei que vou sofrer com meus amigos, me envolver até o último instante com seus problemas, dar pitacos, tentar resolver suas vidas, rir com eles até não aguentar mais. Eu sou intensa. Amo pra sempre. Me magoo pra sempre. Comigo é tudo ou nada.

Mas isso tem um preço. O autoconhecimento exige enfrentar demônios - muitos demônios. Faz a gente querer ser melhor e se frustrar ao não conseguir. É um dedo pressionando a ferida, cada vez com mais força. Olhar para dentro e enxergar as falhas é penoso. Afinal, quem não gostaria de ser somente bom, justo, não julgar, não bisbilhotar, não ser supérfluo ou superficial? Eu adoraria. Mas, por me saber exatamente como sou, tenho a consciência de que a caminhada ainda é longa. E sigo. Porque o custo por desconhecer-se é infinitamente maior.


Texto publicado no caderno Divas, do Jornal ABC Domingo, em 25/01/2015.

Comentários

AC disse…
Um texto que poderia, perfeitamente, subscrever.
(Caramba, Magali, acho que temos tantas coisas em comum!)

Um beijinho :)